domingo, 26 de março de 2017

Aqui parada...


Vai adiantado o tempo da Quaresma,
E eu continuo ainda aqui parado
Nesta página em branco da calçada.

Sei bem que foste tu que me puseste em movimento,
Que teceste o meu ser,
Que me deste a vida e de comer,
Que me acolheste e me acolhes sempre em tua casa.

Como é que estou então aqui parado na berma desta estrada,
Pensando que fui eu que me pus no ser,
Que sou dono de mim,
Que esta vida é minha,
Minha é esta casa, este pedaço de chão,
Este naco de pão
E até este coração?

Não fiques aí parado, meu irmão.
Ergue-te e vai pelos nós do vento,
Chegarás por certo à pátria do Espírito,
Submisso ao sopro obsessivo do silêncio.

Olha com mais atenção
O chão que sonhas,
O céu que lavras.
Recomeça!
Conquista o espaço
Onde a palavra cresça
Longe do ruído das palavras!

António Couto